Diante de incapacidade financeira, executivos e empresários brasileiros recorrem aos seus advogados imaginando que resolverão o problema por sua judicialização através da Recuperação Judicial. Pior, a maioria dos advogados, ainda que bem intencionados, concorda com o procedimento. Esse processo é radical e tecnicamente errado, fazendo com que mais de 80% dos casos no Brasil redundem em falência, enquanto no resto do mundo este número é um quarto dele.
O primeiro erro conceitual e técnico da tragédia é não perceber que toda empresa é um ser vivo composto de várias dimensões: operações, mercado, pessoas, tecnologia, estrutura de capital e gestão, a qual inclui as variáveis de governança, planejamento, controles, processo decisório, sucessão, afinidade societária. O funcionamento desse conjunto requer dinheiro que flui – similar a sangue no corpo humano – influenciado pela correção e harmonia do todo ou pela falta disso. Como consequência, haverá um caixa positivo ou negativo. Por isso, enfrentar e resolver o problema requer um diagnóstico amplo, geral e irrestrito para entender origens, causas e efeitos, e depois desenhar as ações corretivas que se impõe. Apenas uma equipe técnica, sênior, experiente e isenta será capaz de mapear o cenário e – como uma junta médica – traçar as ações e caminhos da solução.
O segundo erro recorrente do caos é desprezar o fato de que todas as ações do receituário de cura requererão dinheiro novo, quantificado e com origem identificada. Mudanças, contratações, demissões, produtos, investimentos, etc, nada será possível sem dinheiro novo. Sua origem poderá ser os atuais acionistas, alienação de ativos, crédito por credores atuais ou novos, aporte por novos investidores ou outras fontes, mas a equação precisa ser desenhada e resolvida antes de qualquer movimentação efetiva.
As tarefas de diagnóstico, desenho de ações resolutivas e de “funding” devem se constituir no verdadeiro “Plano de Recuperação”, sendo objeto de discussão, ajuste e acordo entre a empresa devedora e seus credores, com realismo, transparência e ciência, objetivando sucesso e sobrevida em benefício de todos os “stakeholders. “
Desta discussão tecnicamente embasada poderão decorrer, em síntese, 3 cenários:
1) Haver plena viabilidade de se recuperar a empresa apenas através de ações operacionais e de gestão, decorrentes de negociação / mediação, acordos, flexibilizações, novos produtos, mercados, gestores, etc;
2) Haver necessidade de alguns procedimentos judiciais para viabilizar ou assegurar a plenitude do “Plano”, eventualmente com uma Recuperação Extrajudicial;
3) Haver a necessidade de um processo de Recuperação Judicial, diante de fatos, posturas ou posicionamentos de credores impeditivos da implementação do “Plano”.
Esta é a lógica e ordenamento tecnicamente correto e mundialmente seguido: o “Plano”, decorrente de um diagnóstico preciso, ANTECEDE qualquer ação ou movimentação. Ou seja, o sucesso na recuperação de empresas decorre de tríplice aliança: gestão + dinheiro novo + suporte jurídico, onde ninguém é solução sozinho. O hábito de recorrer à RJ para depois tentar montar um plano e sair à cata de recursos, sem os adequados ajustes de governança e gestão é a causa da trágica mortandade empresarial brasileira.