Muito se tem falado sobre empresas em dificuldades de vendas. Apesar de as indústrias sofrerem quando algo não funciona como o previsto, o ponto a ser abordado a seguir, é percebido, mais facilmente, nos setores de comércio e de serviços. Há décadas as empresas têm pregado que o importante é a satisfação do cliente. Geralmente isso vinha funcionando. No entanto, empresas emblemáticas como a Kodak e Olivetti, cujos “cases” já foram bem explorados nos cursos de MBA no mundo todo, satisfaziam seus consumidores com louvor. Mas, não puderam, ou não souberam, acompanhar as tendências dos avanços tecnológicos da época. As inovações com suas tecnologias disruptivas surgiram e transformaram aquelas duas empresas, praticamente, em pó.
Mas o que teria mudado de poucas décadas para cá? A resposta passa pelo comportamento do consumidor. Ele é fiel a uma marca ou um produto até o momento em que apareça algo novo, com maior atratividade e potencial de satisfação de seus desejos. As transformações tecnológicas estão atropelando o marketing tradicional. A pandemia da Covid-19 acelerou este processo comportamental. Compras pela internet passaram a ser a solução para boa parte dos consumidores em isolamento social. O marketing digital, que já estava sendo bem aplicado antes, acelerou iniciativas engavetadas pelas empresas, principalmente as menores. Hoje muitos restaurantes, varejo e serviços diversos encontraram nas redes sociais e aplicativos de comunicação, a saída para sua sobrevivência, o que todo mundo sabe. Aquilo que nem todos se deram conta é a necessidade de ir além da satisfação: a obrigação de “encantar” o consumidor.
Um consumidor satisfeito adquire um produto ou serviço, segundo suas necessidades ou desejos. Atender a requisitos básicos de preço, prazo de entrega e qualidade pode gerar satisfação, mas não encantamento, necessariamente. A satisfação atende a obrigação de quem fornece alguma coisa ao cliente, mas o encantamento vai bem além: ele precisa surpreender, agregar algo mais do que o esperado, algo que fidelize o consumidor. Lembro, para exemplificar, que certa vez havia feito uma reserva em uma locadora de automóveis nos EUA, com boa antecedência. Chegando lá, não havia nenhum carro igual ou semelhante disponível, dentro das condições que me propunha. A locadora me enfeitiçou quando disse que aquilo não seria problema e me entregaria, sem cobrar qualquer valor adicional ao contratado previamente, um carro bem superior – um Cadillac de luxo –. Este upgrade de produto, sem oneração me seduziu pelo encantamento. A locadora passou a ter a minha preferência.
Um amigo me contou que havia comprado um roteador de wifi de uma das maiores varejistas do mundo. Depois de três meses, soube que ela passara a comercializar uma versão nova do dispositivo, com algumas vantagens técnicas para o usuário. Ele entrou no chat da empresa e disse que, apesar de satisfeito com o que tinha e não estar reclamando de nada, gostaria de uma instrução do que poderia ser feito com o modelo “velho” (apenas 3 meses de uso), pois ele decidira comprar o novo. Afirmou estar tentado pelo lançamento veiculado. A atendente confirmou seus dados e disse que em 24 horas ele receberia uma etiqueta de devolução para o produto “antigo” e o mesmo entregador estaria lhe passando o modelo novo, sem custo algum. Este amigo ficou tão encantado com a empresa, que disse que só compraria deles dali para frente. Mais do que isso, ele passou a ser um promotor da marca, tanto que eu soube do fato pelo seu relato espontâneo em uma live com um grupo de amigos.
Outro caso de encantamento, que vale a pena relatar, foi contado pelo CEO de uma grande loja de departamentos, em uma das tantas lives que assisti em 2020. Era sobre um gerente de uma das lojas da empresa dentro de um shopping center. Certo dia, um consumidor, que deixara um terno adquirido na loja para ser ajustado ao seu tamanho, veio buscar a mercadoria. Ele teria uma festa importante naquele dia e contava com aquela roupa. O vendedor que o atendeu não sabia o que fazer, pois o alfaiate terceirizado não havia feito o serviço ainda. Antes do cliente ficar aterrorizado, o gerente, que já havia sido envolvido na questão, tomou uma decisão: de posse das medidas do cliente, foi até uma loja de um concorrente dentro do shopping e adquiriu, para sua empresa, um traje equivalente. O cliente, nem precisaria dizer, ficou felicíssimo com a atitude do gerente. O assunto ganhou voz dentro da empresa e chegou aos ouvidos do CEO. Ele foi até a loja e pediu que o gerente lhe contasse, pessoalmente, aquela história. Assim foi feito e o gerente disse que estava com medo de perder o emprego pelo ocorrido, mas faria de novo, se preciso fosse. O CEO o surpreendeu, rasgando elogios pelo feito e disse que aquilo era, exatamente, o que esperava de seus gestores. Eles deveriam sempre priorizar a excelência no tratamento aos seus consumidores, pois eles sempre retornam à loja quando se sentem encantados com ela. Mais, disse o CEO, que este exemplo seria citado em todos os encontros com a equipe de gestores das lojas. A cultura da empresa precisava de exemplos reais de práticas adotadas com sucesso, a servir de inspiração.
Muitas empresas vão muito bem até a hora de ganhar o pedido do consumidor. Infelizmente, pecam no pós-venda. Para encantar e fidelizar, é preciso criar um canal de relacionamento com o consumidor. O que sua empresa faz diante de reclamações? E no quesito da assistência técnica, a empresa resolve, rápida e eficazmente, as solicitações dos seus consumidores? O consumidor quer ser agradado, lembrado e recompensado. Cada empresa deverá encontrar suas formas de fazer isso para ter clientes duradouros.
A buzzword atual das estratégias de marketing é a tal da experiência do consumidor. Escritórios, consultórios, bancos, cafés, livrarias, restaurantes e incontáveis outras atividades criam ambientes que contribuem para uma ótima experiência do cliente. Além do atendimento de excelência (uma obrigação para se ter sucesso), o cliente quer experimentar, quer tocar nos produtos, quer uma sala de espera com wifi e um espaço para coworking, sem ser importunado a todo instante por um vendedor. Quando quiser ser atendido, ele espera por um consultor e não alguém que lhe queira empurrar uma venda a qualquer custo. Por isso, adoro as lojas da Apple. Colocar este novo bordão da “experiência do consumidor” em prática exige um novo mindset dos empreendedores e executivos. Muitos ainda precisam sair do modo anterior, o da satisfação, para o encantamento do consumidor. Os vencedores já se deram conta disso há um bom tempo.
Marco Juarez Reichert
Bacharel em Administração de Empresas, MBA em Finanças e Governança Corporativa e Pós MBA em Inteligência Empresarial.
Escritor, palestrante, consultor empresarial e conselheiro de administração.
Membro associado da ORCHESTRA SOLUÇÕES DE GESTÃO